"CANIBAIS DE GARANHUNS" SÃO CONDENADOS A 210 ANOS DE PRISÃO

Sete jurados decidiram na noite deste sábado que os três réus são culpados pelas acusações de terem matado, esquartejado e comido a carne de duas mulheres
Acusados chegaram ao fórum por volta das 9h20 deste sábado. Foto: Renatta Gorga/TVClube
O canibalismo que chocou o país e estigmatizou a cidade de Garanhuns, no Agreste do estado, era parte de um ritual de purificação de uma seita criada por Jorge. Outro ingrediente nunca comprovado pelos investigadores – a suposta venda de coxinhas e empadas recheadas de carne humana pelos réus – deu dimensão internacional ao caso
Uma fatura de cartão de crédito e um livro cheio de desenhos macabros foram as peças-chave da investigação policial que desvendou, em 2012, a série de crimes de maior repercussão da história de Pernambuco. Marcada por diversas cenas de terror, a história de mortes brutais cometidas pelos chamados “Canibais de Garanhuns”.
Em decisão unânime, um júri formado por cinco homens e duas mulheres selou, na noite deste sábado, o destino dos três réus que ficaram conhecidos em todo o país como os “Canibais de Garanhuns”. Jorge Beltrão Negromonte da Silveira, Isabel Cristina Pires da Silveira e Bruna Cristina Oliveira da Silva foram condenados pelas acusações de duplo homicídio triplamente qualificado, ocultação e vilipêndio de cadáver e de furto qualificado. O juiz Ernesto Bezerra Cavalcanti começou a proferir a sentença às 22h50.
Jorge pegou 71 anos de reclusão, enquanto Isabel, 68. Bruna, que também respondia por falsidade ideológica, recebeu 71 anos e 10 meses. Somadas as punições, o trio foi condenado a 210 anos de prisão. A defesa dos condenados já recorreu da decisão. Concordando com a denúncia do Ministério Público e da Polícia Civil de Pernambuco, os jurados consideraram que os três acusados realmente mataram, esquartejaram, enterraram e comeram parte da carne dos corpos de Giselly Helena da Silva, 31 anos, e Alexandra Falcão, 20 anos. Os crimes foram cometidos em fevereiro de 2012, na casa que o trio morava em Garanhuns, no Agreste pernambucano. A sentença ocorreu após dois dias de julgamento. Na sexta-feira, o embate entre acusação durou entre as 10h30 e as 20h30.
Neste sábado, o julgamento dos réus recomeçou às 9h20, na 1ª Vara do Tribunal do Júri da Capital, que fica no Fórum Desembargador Rodolfo Aureliano, na Joana Bezerra, Recife. Bastante concorrida, a sessão foi acompanhada por uma sala de audiência lotada, entre parentes das vítimas, jornalistas e curiosos.
No papel de acusador,o Ministério Público escalou como testemunha o ex-delegado Wesley Fernandes Oliveira, responsável pela investigação e pela prisão dos réus quando ainda era titular da Delegacia de Garanhuns. Atualmente, ele é promotor de Justiça em Alagoas.
Após o depoimento de Wesley Fernandes, os réus foram interrogados. Na sequência, o julgamento teve o debate entre o promotor de acusação e os advogados de defesa dos canibais. Cada um teve até duas horas e meia para expor seus argumentos. O promotor do caso ainda teve direito a réplica de até duas horas de duração, além de tréplica para a defesa com a mesma duração. Só após o cumprimentos desses procedimentos é que os jurados decidiram se condenavam ou absolviam Jorge, Isabel e Bruna.
Não é a primeira vez que o trio divide o banco dos réus. Em 2014, eles foram condenados pela morte de Jéssica Camila da Silva Pereira, 17 anos, cujo homicídio cometido em Olinda, em 2008, teve os mesmos requintes de crueldade do duplo homicídio registrado no Agreste pernambucano. Jorge foi condenado a 23 anos de prisão, enquanto Isabel e Bruna receberam penas de 20 anos, cada. Todos continuam presos desde 2012.
Entenda o caso
A onda de crimes dos canibais teve fim quando uma fatura de cartão de crédito de Giselly, então desaparecida em Garanhuns, chegou na casa da sua família, que desconfiou de gastos feitos dois dias após o seu sumiço. Acionada, a polícia percorreu as lojas rastreadas e, analisando as câmeras de segurança desses estabelecimentos, descobriu que Jorge e Isabel fizeram as compras com o cartão da vítima.
Além de encontrarem os restos mortais de Giselly e Alexandra enterrados no quintal, as buscas na casa do bairro de Jardim Petrópolis, ocupada pelo trio e por uma criança de cinco anos, ajudaram a elucidar outro crime cometido em Olinda quatro anos antes. 
Achado em um cômodo da residência simples, o livro Revelações de um Esquizofrênico é, ao mesmo tempo, uma confusa autobiografia de Jorge e uma confissão codificada do assassinato de Jéssica Camila da Silva Pereira, 17 anos.
Paulo Berenguer, delegado da Polícia Civil que investigou a morte de Jéssica há seis anos, lembra que o livro foi uma espécie de guia do trabalho policial. “Jorge escrevia vários capítulos de forma codificada, como se ele tivesse querendo passar uma mensagem pra que a gente descobrisse algum fato que, no caso, era o homicídio de Jéssica. Li o livro para tentar entender o que se passava na cabeça dele”.
Como nos filmes sobre assassinatos em série, a investigação mergulhou nas entrelinhas do livro e nos desenhos soturnos do canibal, que citava aleatoriamente uma “adolescente maldita” chamada Jéssica. Um dos desenhos mostra um corpo esquartejado em um banheiro, a exemplo do que ocorreu com Jéssica em 2008, quando foi atraída e morta pelo trio numa casa no bairro de Rio Doce, posteriormente descoberta pela polícia.
Vendedora de doces nos sinais do bairro de Boa Viagem, Zona Sul do Recife, Jéssica foi escolhida como alvo por ser socialmente vulnerável e por ter uma filha pequena, que teve os documentos adulterados e passou a ser criada como se fosse filha biológica de Bruna. As vítimas de Garanhuns tiveram o mesmo destino porque também eram consideradas impuras. “Segundo a seita dele, ele deveria dividir o corpo, extrair todo o sangue porque aquele sangue era impuro. A partir de um momento em que ele extraísse todo o sangue, a carne ficava pura. E aí ele consumia a carne da vítima purificada, que também iria purificar o corpo dele”, esclareceu o delegado Paulo Berenguer.
Júri dos três acusados recomeçou neste sábado. Foto: Renata Gorga/TV Clube

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